quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Ilhas de lixo tóxico ameaçam vida nos oceanos


A bordo do Alguita, 1000 milhas a nordeste do Havai. Neste remoto pedaço do oceano Pacífico, a centenas de milhas de qualquer fronteira nacional, os detritos da vida humana estão a reunir-se num remoinho cujas dimensões desafiam uma medição exacta.

Lâmpadas, tampas de garrafas, escovas de dentes, pauzinhos de chupa-chupas e minúsculos farrapos de plástico do tamanho de grãos de arroz povoam a lixeira do Pacífico, cuja área duplica a cada década e se crê ter agora cerca de duas vezes o tamanho do Texas. Um instituto de investigação calcula que o lixo está agora presente em todo o oceano Pacífico, embora na sua maior parte seja apanhado pelo que os oceanógrafos chamam um giro, uma zona com correntes fortes e ventos fracos que o mantém a rodopiar num remoinho gigante.
Os cientistas dizem que o campo de lixo é apenas um de cinco que existem nos oceanos do planeta. Parte do lixo é composto por tralha deixada pela pesca, como bóias, linhas e redes, mas outros elementos têm origem em terra, de onde foram varridos por tempestades para o mar alto.
O plástico é o detrito mais vulgar, por se tratar de um produto descartável, que é leve, durável e omnipresente, tanto em sociedades avançadas como em desenvolvimento. Pode flutuar centenas de milhas até ser apanhado num remoinho e demora a ser decomposto.
Quando finalmente se desintegra, os fragmentos parecem confettis atirados para a água. Milhões, milhares de milhões ou mesmo biliões dessas partículas flutuam nos giros oceânicos transformados em lixeiras.
Produtos químicos tóxicos como o bifenil policlorado (PCB), o diclorodifenil-tricloroetano (DDT) e outros não se dissolvem na água, mas o plástico absorve--os como uma esponja. Os peixes que se alimentam de plâncton ingerem as partículas mais pequenas. Os cientistas da Algalita Marine Research Foundation dizem que os tecidos dos peixes contêm alguns dos químicos do plástico. E especulam que os químicos tóxicos estão a infiltrar-se nos tecidos dos peixes devido ao plástico que ingerem.
Os investigadores dizem que quando um predador - um peixe maior ou um ser humano - come o peixe que comeu o plástico pode estar a transferir as toxinas para os seus próprios tecidos e em grandes concentrações, uma vez que as toxinas provenientes de uma sucessão de fontes alimentares podem acumular--se no organismo.
Charles Moore encontrou a lixeira do Pacífico por acaso há 12 anos, ao regressar de uma regata no Havai. Enquanto comandante, Moore levou três investigadores, o seu arrais e um jornalista até à lixeira este Verão, no que é a sua 10.a viagem científica ao local. Está convencido de que estão por descobrir outras lixeiras semelhantes.
"Em qualquer lugar onde se procure a sério, vão encontrar-se mais", afirma.
Muitos cientistas acreditam que existe uma lixeira ao largo do Japão e outra no mar dos Sargaços, no meio do oceano Atlântico.
Bonnie Monteleone, aluna da Universidade da Carolina do Norte (Wilmington), no decurso da investigação que fez para preparar o seu mestrado sobre acumulação de plástico nos oceanos, visitou, com Moore, o mar dos Sargaços no fim da Primavera e a lixeira do Pacífico no Verão.

"Vi concentrações muito mais densas na lixeira do Pacífico do que no mar dos Sargaços", afirma Monteleone, embora reconheça que é possível que não tenha encontrado o giro do Atlântico.

Monteleone, que integrava a tripulação do navio de Moore na qualidade de voluntária, esperava poder encontrar pelo menos uma amostra retirada da zona que não contivesse lixo. "Só uma pequena zona - uma só", diz. "Era só o que eu queria ver. Mas em todo o lado havia plástico."
A lixeira do Pacífico ficou muito conhecida depois de três conceituadas organizações de investigação marinha a terem visitado este Verão. Uma delas, a Project Kaisei, sedeada em São Francisco, está a tentar descobrir maneiras de a limpar, talvez pela transformação do plástico em diesel.
Ambientalistas e celebridades estão a servir-se da lixeira para promoverem as suas próprias causas. O grupo sem fins lucrativos Oceana, do actor Ted Danson, declarou que Moore era um herói pelo seu trabalho relativo à lixeira. Outra figura de Hollywood, Edward Norton, foi narrador de um anúncio do serviço público acerca de sacos de plástico, que acabam por ir parar à lixeira.
Moore foi a primeira pessoa a ter feito um estudo científico sério, recolhendo amostras da lixeira oceânica. Em 1999 entregou esse estudo à fundação Algalita. Presentemente, a fundação está a examinar detritos plásticos e retira amostras de águas poluídas na costa californiana e em todo o oceano Pacífico. Arrastando uma rede de malha apertada, a embarcação de investigação de Moore, o Alguita, um catamarã de 50 pés de alumínio, apanha pequenos fragmentos de plástico.
Os investigadores medem a quantidade de plástico presente em cada amostra e calculam o peso de cada fragmento. Testam também os tecidos dos peixes capturados na mesma rede, para medir o nível de substâncias químicas tóxicas. Numa expedição anterior apanharam um salmão do Alasca que tinha 84 pedaços de plástico no estômago.
A equipa de investigação ainda não mediu a presença de substâncias tóxicas presentes nas capturas mais recentes, mas as amostras de água revelam que há uma quantidade cada vez maior de plástico no giro e no Pacífico em geral. As amostras de água recolhidas em Fevereiro continham o dobro do plástico das de há uma década.
"Isto não é a lixeira que eu conheci em 1999", declara Moore. "É um monstro completamente diferente."
Para o arrais, Jeffery Ernst, a lixeira é "apenas uma prova de que não existe lugar algum que não seja afectado pelo homem".
ionline

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