quinta-feira, 12 de março de 2009

Opínião-O fim do casamento, poligamia e incesto



No que respeita às polémicas em torno do chamado casamento gay, há uma conspiração de silêncio colectiva em relação ao princípio da universalidade do Direito que recomenda que se legisle o interesse particular em conformidade com o interesse geral e com outros interesses particulares.
O ensaísta Charles Krauthammer escreveu no Washington Post, a propósito das pretensões de legalização da poligamia nos EUA, na esteira do movimento a favor do casamento gay, que o surgimento destas fórmulas de casamento não é a causa mas o sintoma do esboroar do matrimónio tradicional perante a expansão das ideologias individualistas radicais.Para ele, é juridicamente indefensável discriminar positivamente a união homossexual no momento de alargar as fronteiras conceptuais do casamento, face a outras possibilidades lógicas de união matrimonial não autorizadas. A consequência lógica da extensão do âmbito legal de forma a abarcar os interesses homossexuais, em nome do direito à não discriminação de opções individuais ou culturais, é a abolição dos princípios de monogamia e de proibição de incesto.
Lembremos: a justificação para a proibição de incesto é a eventualidade de dele resultar uma prole geneticamente anómala. Já a premissa monogâmica assenta numa justificação cultural e não biológica. A poligamia carece de fundamento normativo no Ocidente por não ser suportada por preceitos religiosos, ao contrário da lei islâmica, e exprime uma inadmissível assimetria estatutária entre homens e mulheres.
Mas, preceitos e crenças religiosas à parte, os defensores do casamento gay deverão, em nome do princípio de universalidade do direito, defender toda a união incestuosa de que não resulte uma prole geneticamente enfraquecida e toda a união poligâmica (ou melhor, poliamorosa) que não promova assimetria entre sexos.
Legalizar o casamento gay implica negar a exclusividade categorial do casamento tradicional, definido como uma união entre dois indivíduos de sexos opostos e sem laços consanguíneos. Assim, o legislador que equipare aquela união a esta será logicamente forçado a não distinguir entre o direito de dois indivíduos do mesmo sexo, não aparentados entre si, a casar e adoptar filhos, e o direito de três indivíduos consanguíneos e do mesmo sexo à união matrimonial e à adopção. A legalização do casamento homossexual exige, portanto, a regulamentação do seu corolário mais extremo – nomeadamente, o casamento homossexual incestuoso poligâmico.
Se colocamos em causa um dos critérios definidores da noção de casamento (união entre sexos opostos), então que justificação lógica e jurídica haverá para não descartarmos os outros dois (união restrita a dois indivíduos, não consanguíneos)? O mais curioso, e diríamos paradoxal, em toda esta polémica é a insistência com que as ideologias individualistas radicais, subjacentes ao casamento gay, se afirmam como bandeiras da esquerda, e não da direita.
Manuel João Ramos /Antropólogo

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